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A arte e o Sagrado – Por André Aguiar

Nesses tempos difíceis que desafiam a nossa Fé, nossa estabilidade, emocional, espiritual e material, diante de tantos sofrimentos e perdas, fui “catapultado” ainda mais longe na necessidade de encontrar meios eficazes de abrandar as dores e perdas de pessoas queridas e até desconhecidas.

A humanidade passa em todo o mundo por um período de um árido deserto espiritual, caminha a passos largos como uma manada para uma vala escura e profunda. Enganamo-nos por sequer conhecer o próprio caminho e temos a petulância de enganar a nossa própria espécie, no intuito de controlar a vida e os caminhos dos outros.

Ainda temos a falsa certeza de que temos o controle de nossa própria existência, no entanto, sequer temos o poder de encher os nossos pulmões de ar, quando mais precisamos respirar.

Como se não bastasse, deliberadamente, profanam o sagrado, zombam de Deus, abandonaram a Fé e ainda tem a necessidade de agredir essa mesma Fé que perderam. Negam O Amor de Deus, na tentativa de refazer o mundo como se o Amor não fizesse mais parte dele, uma cultura sem Amor e, portanto sem Deus.

Chegaram ao absurdo de arrastar uma imagem de Jesus, numa festa pagã como se o mal tivesse triunfado sobre o bem, esquecendo que foi de Deus que escarneceram e agora gritam: Piedade Senhor. Na verdade, o mal não se afasta do Bem porque tem medo Dele, mas por não conseguir encará-lo face a face.

Separam os homens em classes de raça e de cor, de pobres e de ricos, de gêneros e de transformados. Matam nascidos e matam antes de nascer, o sangue já escorre nas vias públicas.

Governantes fecham os templos cristãos, como se fossemos o inimigo número um nessa pandemia, uma plêiade de ateus e de falsos cristãos que colaboram entre si, por interesses outros e impublicáveis.

Para agravar esse triste quadro, trabalhadores são impedidos de trabalhar e sem o trabalho, já não sustentam as suas famílias e se lançam ao desespero. É o caos instalado.

Mesmo diante de um quadro tão difícil, tenho encontrado de maneira muito particular, através da música, (que para mim fala além das palavras, usa outra linguagem, fala direto ao nosso coração) da escrita e por óbvio de orações a Deus, um bálsamo para tantas dores e sofrimentos. Embora que, de uns anos para cá, também me vi surpreendido e encantado pela pintura, notadamente quando essas me impulsionam a apreciar a beleza das coisas do Alto, esse valor tão importante quanto a verdade e a bondade.

Sabemos que desde o início de nossa civilização, quando enfrentamos grandes dificuldades a arte de maneira geral, tem o poder de transformar o que é mais doloroso na condição humana e redimi-la em uma obra de beleza, é uma espécie de laço invisível e tênue, mas, muito forte com o sagrado. A arte tem a habilidade de deixar mais leve os fardos da vida.

Seja na contemplação do raio do sol, ou uma paisagem divina, a lembrança de uma música, ler um poema que parece conter a essência daquilo que se descreve, ou ainda observar o rosto de uma pessoa amada, o sorriso de uma criança ou de um idoso, a vida que se expressa nele, sua carne se transforma em espírito e ao fixar nossos olhos, vemos através da alma.

Basta um olhar mais acurado na nossa vida cotidiana, para percebemos que algumas situações são atemporais, nos elevam o espírito, nos aproximamos do divino, outra ordem bem superior, nos tornamos por assim dizer, amigos de Deus, construímos um “Lar” com Ele.

Nas pinturas de Rembrandt, por exemplo, o artista nos lembra de que a beleza é algo corriqueiro e está ao nosso redor, o acontecimento mais banal pode ser transformado em algo belo e assim podemos ver o “coração das coisas”.

Os artistas antigos (desde lá) estavam cientes que a vida humana é cheia de caos e sofrimento, mas eles tinham um remédio para isso, o nome do remédio era a beleza de sua arte.

Para Platão a arte era um caminho para Deus, que mesmo diante da morte os seres humanos ainda são capazes de mostrar nobreza, compaixão e dignidade e a arte ajuda a aceitar isso, mostrando-nos sobre tal perspectiva.

A bela obra de arte trás consolação na tristeza e afirmação na alegria, ela mostra que a vida humana vale a pena. A beleza da arte e a sua relação com o Sagrado é a revelação de Deus no aqui e agora.

Assim começo a entender o motivo pelo qual a Igreja se utiliza desde seu início (catacumbas) da arte para falar de Deus, haja vista que insiste em cumprir as Suas ordens, quando determinou que Moisés mandasse construir uma arca, mais de dez séculos antes do nascimento de Jesus de Nazaré. Referida Arca era uma mala de 1,10 m. de comprimento por 0,65 cent. de altura, feito de madeira de acácia, revestido de ouro por dentro e por fora, tendo na parte externa e superior (na tampa) duas imagens de querubins esculpidas em ouro maciço, além de outros objetos que a acompanhava. Desde ali,  O Sagrado quis se entrelaçar e se comunicar conosco através da arte, Deus fez seu “Lar” (Êxodo 25, 10-40).

Contemplando as obras de  Michelangelo Buonarroti na Capela Sistina, ou em Gian Lorenzo Bernini na escultura que retrata em estilo barroco  – e é considerada uma das obras primas daquele estilo -, no famoso êxtase de Santa Tereza. Seja ainda nos vitrais e em toda a obra fantástica e monumental da Catedral de Notre-Dame em Paris, ou em todas a obras de arte constantes nos Templos ou museus espalhadas por todo o mundo, nós vemos um sinal de Deus, “sentimos” Deus falando.

Não poderia esquecer-se de elencar o acervo do museu do Prado em Madrid, que é composto por mais de 17 mil obras de arte com ênfase dentre tantos outros, para Velázquez e Goya. O Prado possui a mais importante coleção de arte espanhola do mundo, seguida em importância por sua coleção de arte italiana e flamenga.

Por justiça, quero aqui homenagear alguns homens e mulheres que exercendo a sua missão evangelizadora na Paraíba se utilizaram da arte para levar o Sagrado às pessoas.

A começar por Leonildo Francisco de Oliveira (meu bisavó) conhecido como Nezinho Pintor, autor dentre outras, mas em destaque daquele célebre quadro de Jesus dando a Hóstia Consagrada, no qual se encontra na secular, belíssima e rica Igreja de São Francisco e ainda o Memorial São Francisco, localizada no Centro Histórico da Capital da Paraíba, e que muitas crianças nos tempos antigos, no dia de sua primeira comunhão, tiravam as fotos ao lado daquela, fazendo parecer que estava recebendo do próprio Jesus a Eucaristia. Uma linda obra de arte.

Lembro-me de três grandes compositores que foram o Padre José Coutinho (Padre Zé), seu irmão João Coutinho (escritor e músico) e Monsenhor Abdon Milanês, (compositor). Em minhas pesquisas descobri Severino Melo que era restaurador e pintor de obras sacras, bem como o meu amigo de saudosa memória o Monsenhor Eurivaldo Caldas Tavares (escritor e membro do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba). Lembro ainda do meu Professor na Escola de Agronomia do Nordeste (UFPB), nos idos de 1983, o Monsenhor José Rodrigues Fidélis, (Pároco de Remígio – PB) que foi professor de música no Seminário Arquidiocesano da Paraíba e regente do Coral Diocesano. Concluo em apertada síntese, lembrando o Monsenhor João de Deus (Poeta e orador sacro) e com Cônego Ruy Barreiros Vieira (museólogo), que foi Vigário na cidade de Areia e Remígio – PB.

Elencar aqui as irmãs do Colégio das Neves, (Sagrada Família) é muito importante, a começar pela querida Irmã Margarida (poetiza) e Marta Wanderlei que era pintora e ainda no Colégio da Sagrada Família em Jaguaribe a Professora Emília (coral), e a Irmã Celeste (música).

Na cidade de Bananeiras – PB, as irmãs da Ordem das Dorotéais, deram  importante contribuição na edificação cultural daquelas meninas, que estudavam naquele educandário, principalmente, a Madre Petribú (pintura e desenho) e a Madre Dídia Costa (piano e acordeom).

Importante enfatizar as irmãs da ordem Franciscanas do Colégio Santa Rita em Areia, (francesas no início e depois alemãs), por exemplo, Madre Iviolata (canto orfeônico, piano e acordeom) Madre Rafaela  (pintura), Madre Trautulinde (artes manuais, objetos para casa, estética e enfeites).

 Do Colégio João XXIII em João Pessoa, as Irmãs da Ordem das Franciscanas, Irmãs Fátima e Veneranda (música / violão e canto) as Irmã Paula, Irmã Angelina, Irmã Serafina (artes manuais e artesanato), Irmã Filomena (teatro), além da Irmã Margarida (pintura).

Ainda as Irmãs da mesma Ordem Franciscanas no Colégio de Catolé do Rocha, a Irmã Iracy Almeida (música) e a Irmã Estela (artes manuais).

Finalmente as Irmãs do Colégio das Lourdinas (Instituto Imaculada Conceição de Nossa Senhora de Lourdes) que possuía 13 escolas no Brasil e na América do Sul e Europa, cuja província geral situa-se na cidade de Nevers (França), mas que em João Pessoa exercia seu ministério a Irma Leônidas (tapeçaria). Foi o que encontrei e soube por lá.

Os frutos da junção da Arte com O Sagrado são doces e suaves, importantes nesses dias tão amargos. Parafraseando o salmo desse domingo: Criai em mim Senhor, um coração que seja puro!

Por André Aguiar, em 21 de março de 2021.

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